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Conceito, origem do capital, taxas de juros e mais sobre funding para incorporações imobiliárias

Para especialistas, mercado de funding imobiliário no Brasil vive momento de reconstrução
O financiamento de empreendimentos imobiliários no Brasil está passando por um momento de transformações com a escassez de recursos tradicionais, a sofisticação de estruturas jurídicas e financeiras, além da chegada de novas tecnologias.
Essas mudanças estão redesenhando o acesso ao capital para incorporadoras de todos os portes. Para entender esse novo panorama, o primeiro passo é ter claro qual o conceito de funding, que vai além da simples captação de dinheiro, como relata Eduardo Buzzi, líder de investimentos da Terracotta Ventures,
“O funding abrange uma visão mais estratégica, pensada em dois níveis. No nível de projeto, analisamos a viabilidade com ênfase nas negociações de pagamento com fornecedores e acordos de recebimento com clientes. No nível do empreendedor, avaliamos as estratégias de alavancagem financeira com investidores, que permitem ao empreendedor maximizar o seu retorno e objetivos individuais dentro de cada um de seus projetos”, explica Buzzi.
De onde vem o capital
Já Cali Galera, sócio e diretor de novos negócios da Trinus, destaca a importância de pensar em primeiro plano na origem do capital disponível para linhas de financiamento à incorporação.

“São elas o SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo) que tem como origem do capital a Caderneta de Poupança do Brasileiro, O SFH (Sistema Financeiro de Habitação) com origem principalmente do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), além de também utilizar recursos da Caderneta de Poupança e o Mercado de Capitais através principalmente de Fundos de Investimento Imobiliário e emissões de Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRIs)”, detalha o diretor.
O executivo ressalta que em 2020 a poupança representava 58% da fonte de recursos no crédito imobiliário, tendo registrado mais de R$ 240 bilhões em resgates líquidos nos últimos quatro anos. O FGTS, embora representasse, no mesmo ano, 25% do crédito imobiliário, é prioritariamente direcionado para o financiamento de pessoas físicas, enquanto o Mercado de Capitais ficava com 17% dos financiamentos do setor.

“Esse cenário tem limitado muito o acesso do incorporador a linhas com a poupança como fonte. E o capital tem sido direcionado aos financiamentos imobiliários de pessoas físicas, prioridades dos bancos.”
Cali Galera
Com isso, o mercado de capitais tem ganhado protagonismo — com crescimento acelerado na emissão de CRIs e atuação de fundos imobiliários —, mas ainda exige governança sofisticada por parte das incorporadoras.
“O número de investidores em FIIs (Fundos de Investimentos Imobiliários) saiu de pouco mais de R$200 mil em 2018, para R$2,6 milhões em 2024, sustentando um crescimento acima de 60% anual, com evolução patrimonial superando a casa de R$350 bilhões”, destaca Galera.
Em 2024, destaca o executivo, a poupança representou 39% da fonte de recursos no crédito imobiliário, seguido pelo Mercado de Capitais com 36% e o FGTS mantendo a casa dos 25%. Fora isso, muitos empreendedores ainda utilizam capital próprio para o desenvolvimento de incorporações imobiliárias.
O impacto dos juros e da inflação
Segundo os especialistas, taxa de juros e inflação são termômetros decisivos para o apetite de risco dos investidores e para o custo de captação. Além disso, o atual cenário macroeconômico tem impacto direto na viabilidade dos projetos, como afirma Daniel Miari, CMO e sócio fundador da INCO.

“Em ambientes de juros elevados, o crédito tende a ficar mais caro e restrito — o que pressiona as margens e pode adiar lançamentos. Já em ciclos de baixa de juros, aumenta-se a procura por investimentos em economia real, como o setor imobiliário.”
Daniel Miari
“A inflação, por sua vez, impacta o poder de compra do consumidor e pode interferir no ritmo de vendas. Para o incorporador, ela também pressiona os custos de construção. Nesse cenário, contar com modelos de financiamento flexíveis e com boa previsibilidade de fluxo de caixa se torna ainda mais essencial”, diz o CMO.
É nessa brecha de incertezas que o funding para incorporações imobiliárias passa a buscar cada vez mais soluções que fujam do mercado convencional. Daí a necessidade do empresariado estar de olho nas soluções e novos negócios presentes no mercado.
“Ambientes de juros altos e inflação pressionam o crédito tradicional e tornam o capital mais seletivo. Por outro lado, criam espaço para modelos alternativos se destacarem como fonte de funding eficiente e resiliente”.

Vale pontuar, inclusive, que a estrutura de financiamento deve acompanhar os estágios da incorporação, desde a compra do terreno, projeto, início das obras e execução. Visto, que em todas essas fases os riscos e as exigências variam, a solução de funding encontrada deve estar preparada para cada uma delas.
“Mesmo em cenários econômicos desafiadores, investidores seguem buscando ativos reais, bem estruturados e com boa governança”, evidencia Miari.
Impactos do cenário no acesso ao capital
Buzzi também explica que a taxa de juros impacta o acesso ao funding para novos empreendimentos imobiliários de duas formas principais, sendo elas o custo direto do capital e o acesso ao crédito pelo cliente final.

“Entre 25% e 50% da margem de lucro de um projeto pode ser consumida por juros, reduzindo significativamente a rentabilidade. Para se ter uma ideia, um aumento de apenas um ponto percentual na taxa de juros pode representar uma perda de 5% no lucro do projeto”.
Eduardo Buzzi
“Segundo, juros altos dificultam o acesso a crédito para o cliente final, o que cria um problema adicional para as incorporadoras: a falta de vendas. Quando menos pessoas conseguem financiar a compra de imóveis, os estoques das incorporadoras aumentam, elevando ainda mais o custo de capital e comprometendo a viabilidade financeira do empreendimento”, elucida o executivo da Terracotta.
No caso da inflação, a alta afeta o funding ao pressionar os custos de produção, o que torna o lucro cada vez menor para as incorporadoras. Esse cenário encarece os projetos e torna o acesso a funding mais desafiador, já que os investidores percebem maior risco e exigem retornos mais altos para financiar empreendimentos em um contexto de custos crescentes.
“Desde 2007, a inflação de materiais e serviços na cadeia da construção civil tem reduzido as margens das incorporadoras. Segundo a Pesquisa Anual da Indústria da Construção (PAIC), realizada pelo IBGE, a margem líquida média, que era de cerca de 20% há 15 anos, caiu para aproximadamente 13% hoje”, completa Buzzi.

Ou seja, de forma geral, as taxas de juros mais caras afetam diretamente a margem de lucro dos projetos imobiliários e dos incorporadores. Mas não só isso, o aumento impacta também na capacidade de financiamento disponível para o cliente final.
“Normalmente, o aumento do custo não consegue ser totalmente repassado para o consumidor, pois também dificulta o processo de financiamento do cliente final, reduzindo velocidades de vendas e potencializa o aumento de inadimplências e distratos”, reforça Galera.
“Por sua vez, gerando uma reação em cadeia, a redução de vendas e o aumento de inadimplência e distrato gera pressão no fluxo de caixa do incorporador, que, com menos capital entrando das vendas, tem ainda mais a necessidade de acesso a capital”, complementa o empresário.
- Por Maíra Sobral – Coordenadora de conteúdo na ADIT Brasil
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