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Repercussão da Selic a 2% no mercado imobiliário, na renda fixa e nos Fundos Imobiliários
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) reduziu a taxa Selic de 2,25% para 2,00% na quinta-feira (6). Entre as 40 economias mais relevantes do mundo, o Brasil ocupa a 26ª posição no ranking dos juros reais mais baixos, segundo a Infinity Asset Management. No último ano, a taxa caiu nove vezes. Como fica o mercado imobiliário agora?
Na teoria, a queda significa uma pressão natural para que os bancos reduzam as taxas de financiamento imobiliário. Se a baixa na taxa básica de juros da economia foi motivada pela pandemia do COVID-19, o mesmo vírus deve simbolizar uma resistência dos bancos para a esperada redução. Segundo Tales Silva, sócio-diretor da Hectare, é difícil cravar na pedra o momento exato da queda das taxas de financiamento.
“Podemos dizer que a taxa básica de juros é um dos principais fatores para a precificação do crédito imobiliário. Como o mercado a vê em níveis baixos por um período que deve prolongar-se, isso de fato pressiona a queda das taxas das operações imobiliárias. Contudo, os bancos levam em consideração, também, o risco de crédito de seus tomadores”, diz. “Isso deve acontecer quando os agentes financeiros se sentirem confortáveis com a retomada da economia.”
O estímulo da Selic não deve salvar a economia da contração de renda e do aumento de desemprego, mas é um alívio. Os bancos, geralmente conservadores, avaliam o risco de crédito – que se elevou, juntamente com o nível das avaliações que agora estão mais criteriosas. Outro fator que também influencia o cenário é a concorrência. “É um ponto que tem se acirrado entre esses agentes. Uma vez que alguns deles adotem taxas mais atrativas, os demais também o farão. Reduções na taxa básica poderiam converter-se simplesmente em aumento de seu lucro.”
A Selic (Sistema Especial de Liquidação e Custódia) é a taxa média de juros paga pelo governo brasileiro em empréstimos tomados de instituições bancárias. Sendo uma das taxas mais baixas já vistas no mercado imobiliário, a capacidade de compra dos tomadores aumentou.
Quando a Selic baixa, os bancos emprestam dinheiro aos consumidores, aumentando a oferta de capital disponível no mercado. Quando a Selic está alta, os bancos compram títulos do governo, aumentando assim os próprios rendimentos. Quanto menor a taxa, mais dinheiro circula no mercado e mais financiamentos acontecem, por exemplo. Quanto maior a taxa, maior a desaceleração da economia no país, o que inibe consumos e investimentos.
Vale a pena ressaltar que o crédito imobiliário é de longo prazo, geralmente superando o período de 10 anos. A liquidez atual do mercado e as brigas de preços é um movimento natural. “Para acirrar essa disputa, algumas incorporadoras têm considerado financiar diretamente aos seus clientes, entendendo ser um bom ativo de crédito, além do fato de dispensar os trâmites de financiamento bancário, melhorando a experiência do cliente”, explica Rafael Andrade, VP Real Estate da Captalys. Ele destaca que a empresa oferece todos os tipos de serviços de crédito para o setor, indo além de funding e podendo co-investir no financiamento direto para os clientes.
“Apesar dos eventos de redução na Selic, os juros futuros não seguiram a mesma trajetória. Se tomarmos por exemplo jan/20, com a Selic em 4,25%, e hoje, em 2%, não enxergamos modificação significativa nas taxas negociadas para 2031. Ou seja, já temos essas taxas precificadas”, explica.
IMPACTOS DA BAIXA DA SELIC NO SETOR IMOBILIÁRIO
A queda da Selic impacta a economia como um todo. Silva, da Hectare, explica que os títulos públicos federais passam a ser menos interessantes para os investidores e a tendência é que haja mais recursos disponíveis para os incorporadores executarem seus projetos. “Uma vez que influencia as instituições financeiras a abaixarem suas próprias taxas, há um impacto positivo também na venda de imóveis, impulsionada pelo menor comprometimento de renda dos compradores para seu financiamento.”
Já os investidores que buscam renda no mercado imobiliário sentem um efeito negativo e passam a ser obrigados a testar novos investimentos para manter o nível de rentabilidade que possuíam anteriormente.
Segundo Raphael Corrêa, Especialista de Distribuição da Fortesec, a facilidade do acesso ao crédito com uma taxa de juros menor é a parte positiva. O aspecto negativo é a inadimplência.”Acabar dando crédito para aqueles que não conseguem fazer um controle bem feito da sua carteira é algo bem ruim, e isso pode gerar insolvências altas. Com certeza isso vai fazer com que o acesso ao crédito fique um pouco mais complicado.
INVESTIMENTOS DE RENDA FIXA NA BAIXA DA SELIC
No cenário atual, para o dinheiro do investidor não se desvalorizar, é precisa buscar investimentos que rendam acima de 3% de inflação projetada para os próximos 12 meses. “Desta forma, o investidor de renda fixa precisaria migrar para investimentos com mais volatilidade para não ter de alongar o prazo de suas operações ou então tomar papéis com mais risco de crédito”, conta Tales Silva.
O investimento em renda fixa é o ato de aplicar capital em uma modalidade de ativos que possuem rentabilidade previsível.
Para o VP Real Estate da Captalys, falar desse tipo de comportamento é complexo, pois depende bastante do perfil de cada investidor. “Ainda assim, enxergo um movimento de migração da renda fixa para outras classes de ativos. Muitos investidores ficaram frustrados com o retorno dos chamados fundos de caixa, que prometiam rentabilidade consistente, acima do CDI, com uma janela de resgate curta”, comenta. “Vários deles alocavam seus recursos em papéis sem liquidez, como CRIs, debêntures, LFs e outros, os quais tiveram rentabilidade negativa por conta da marcação a mercado dos ativos da carteira.”
Para Corrêa, da Fortesec, a palavra-chave do momento é cautela. “Infelizmente, ninguém fica rico do dia para a noite sem apostar em ativos mais arriscados, cautela seria a principal virtude que o investidor deveria ter agora.” Para buscar a melhor oportunidade, ele destaca que o investidor precisa se atentar a prazos, liquidez e riscos.
“É preciso se manter fiel à sua filosofia e observar bons negócios que possuem muitas taxas, que no mercado é o que chamamos de prêmio. Se você é uma pessoa que não curte volatilidade e busca retornos mais constantes, é bom prestar atenção aos momentos de grandes solavancos, que possuem grandes altas e baixas”, explica. Dessa forma é possível equilibrar o perfil e encontrar onde se encaixar melhor. “Há 5 anos, quando a Selic estava a 14% ninguém enxergava um cenário como o de hoje. O investidor vai ter de sair um pouco desse mundo no qual fica sentado, conseguindo retornos altos, para começar a diversificar e achar ativos mais arriscados.”
A HORA DOS FUNDOS IMOBILIÁRIOS
No momento, o corte na Selic pode significar um favorecimento nos ativos de renda variável. Fundos de Investimento Imobiliário, os FIIs devem ser beneficiados – visto que o crédito foi barateado, incentivando assim o mercado.
Fundo de investimento imobiliário é uma comunhão de recursos destinados à aplicação em empreendimentos imobiliários. O FII é constituído sob a forma de um condomínio fechado, sendo dividido em cotas, que representam parcelas ideais do seu patrimônio.
“Acredito que eles já são destaque. Convido a todos a verificar a quantidade de ofertas voltadas a esse tipo de fundo disponíveis nas corretoras. O investidor pessoa física possui isenção no imposto de renda para os dividendos distribuídos, o que torna os fundos imobiliários atrativos”, menciona Andrade. “Atualmente existem 282 FIIs listados na B3, cujo patrimônio líquido supera os R$ 98 bilhões. Ao todo são mais de 896 mil investidores”, conta.
De todas as formas, é importante que o investidor entenda a estratégia de alocação do fundo investido e verifique se está alinhado com o seu perfil. “Além de acompanhar a gestão por meio dos relatórios disponibilizados pelos gestores”, conclui.
Existem fundos de diversos tipos: aqueles que investem em lajes corporativas, shoppings, galpões logísticos e loteamentos, e outros que se voltam para resorts de multipropriedade, operações com e sem obra também. “Esse pode ser o grande ano para os fundos imobiliários. Existe, claro, um grande desafio para mantê-los saudáveis em sua carteira durante a pandemia, mas certamente um ano onde surgirão muitos novos investidores devido a baixa da taxa de juros”, revela Corrêa, da Fortesec.
A expectativa é que os FIIs se solidifiquem ainda mais. “A ideia é que, cada vez mais, seja um produto que pague mensalmente para os seus investidores dividendos que contribuam para o retorno do portfólio do investidor como um todo”, finaliza.