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Desafios e oportunidades para o desenvolvimento urbano no Brasil
Com novas tendências surgindo no mercado, é importante atentar quais erros não cometer no desenvolvimento de novos projetos
Criar ambientes vivos e funcionais é a pauta do momento quando o assunto é o denominado novo urbanismo. Não é de hoje que grandes investidores no mercado imobiliário debatem os problemas enfrentados por cidades que estão presas a um modelo datado do século passado, com um crescimento desordenado que resulta em má qualidade de vida.
O ponto chave do debate sobre o futuro do urbanismo está justamente no fator qualidade de vida. A aglutinação nos centros urbanos sem um planejamento coeso tem transformado a locomoção, moradia e lazer cada vez mais precários, havendo uma demanda social por ambientes mais conectados.
Neste aspecto vemos surgir no Brasil projetos de comunidades planejadas e smart cities (cidades inteligentes), que trazem esse novo urbanismo para os centros das habitações. São áreas com fácil locomoção de pedestres, maior controle sobre do uso das energias, exclusão de congestionamento, proporcionando a tão sonhada qualidade de vida.
Ambientes conectados remetem também ao maior uso das tecnologias. Ao final do século XX, a dupla cineasta Wachowski iniciava um debate importante no seu filme Matrix sobre as perspectivas de um mundo digital coexistindo com o real. Hoje, 19 anos depois, vemos empresas como a Sidewalk Lab e Belmont Partners (com investimento do influente Bill Gates), desenvolverem cidades futurísticas e tecnológicas em Toronto e no Arizona, respectivamente.
Vinculadas a duas das maiores corporações quando se trata de tecnologia, a Google e Microsoft, não há engano em presumir um grande investimento em inovações no setor. O projeto da Sidewalk Lab prevê, por exemplo, pavimentações flexíveis, sensores e câmeras que mapeiam tudo e todos que passam pela cidade, enquanto a Belmont Partners planeja ter um centro de dados ilimitado, infraestrutura com tecnologia de ponta baseada em uma rede de altíssima velocidade e veículos autônomos.
O grande questionamento, no entanto, é qual a viabilidade destes modelos em um país como o Brasil? Até que ponto poderemos encaixar as ideias norte-americanas em uma estrutura que ainda enfrenta problemas básicos como falta de uma rede de dados de alta qualidade para todas as regiões?
A resposta parece ser mais simples do que se imagina, como Tom Saunders, pesquisador principal da think tank Nesta, coloca no estudo Rethinking Smart Cities From The Ground Up: “A chave para pensar sobre smart cities não é focar nas mais novas tecnologias, mas se perguntar: quais os problemas?”.
No Brasil, um dos problemas imediatos a se considerar é o alto índice do déficit habitacional existente. Uma pesquisa publicada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), com base nas Pesquisas Nacionais de Amostra Domiciliar (PNAD) do IBGE, apontou que há carência de 7,7 milhões de moradias no país. O dado é de 2015, o mais recente divulgado pela Fundação.
Em contrapartida, o país possui também uma vasta possibilidade de áreas para uso e desenvolvimento de novas moradias. É o que viu a CEO da PLANET Brasil, Susanna Machionni, há 6 anos durante visita ao Porto do Pacém, no Ceará, quando decidiu investir na região. “Junto com a Universidade de Milão, fizemos uma pesquisa de vários meses. Precisávamos de uma área com grande desenvolvimento econômico e grande déficit habitacional. Aquela área realmente atende essas especificidades”, comenta.
Além do déficit apontado pela pesquisa da FGV, o Ceará apresenta boas perspectivas de desenvolvimento econômico. O hub da Air France-KLM/Gol, inaugurado em maio na capital do estado, traz uma expectativa de crescimento de 1,5 milhões de passageiros em conexão na cidade até o fim de 2018.
Como saber no que investir?
Apesar de uma demanda populacional por uma maior qualidade de vida quando se trata de habitação, a crise econômica experimentada no Brasil pode a causar dúvidas em novos empreendedores com relação ao apetite do mercado.
Diretor e sócio da área de investimentos imobiliários da Captalys, Luiz Gerab, descarta dúvidas e enxerga otimismo para o setor. “Existe oportunidade, mas acredito que tem que ser bem escolhido, você não pode fazer tudo num momento como esse. É preciso ser cauteloso. Acredito que os juros já começaram a estimular a economia de novo. Temos sentido um descolamento da economia da política”, explica.
O investidor aponta a extensão territorial e o déficit como dois fatores que facilitam a venda dos lotes como mais uma opção de moradia, por ser um produto de menor valor agregado. Entretanto, há um ponto chave para o sucesso do projeto: conhecimento da região.
“Tem que entender bem o que está sendo estudado, porque ele está lá, se existe a demanda, como ele avaliou essa situação, como nasceu o projeto, se está bem formalizado, se foi bem estudado, se as aprovações estão certas”, acrescenta Gerab.
Pessoas no centro do planejamento
A extensão territorial do Brasil implanta ainda desafios básicos que validam a indagação de Saunders. Temos regiões distintas que apresentam particularidades próprias, com uma diversidade cultural enorme, fatores que devem ser considerados na estruturação do projeto.
É inviável pensar em um ambiente integrado sem levar em consideração como as pessoas utilizarão o espaço. Eduardo Eichenberger, proprietário da Global Governance enfatiza a necessidade de uma boa gestão de pessoas.
“Falamos em comunidades planejadas porque aquele espaço é ocupado por pessoas. Então, o maior desafio é gerir bem essas pessoas, informar bem, para que aquela comunidade se desenvolva de uma forma saudável compreendendo o espaço que ela ocupa, entendendo o relacionamento que ela estabelece com os seus vizinhos, com público com que convive”, afirma o especialista com 20 anos de experiência em comunidades planejadas.
Retirar os carros do centro urbano é um desafio enfrentado também pelo novo projeto do renomado urbanista Jaime Lerner, a Cidade do Cauype, desenvolvida a 30km do centro de Fortaleza. Em entrevista para o El País o arquiteto chegou a sentenciar: “não há futuro urbano se o transporte depende de veículos particulares”.
É a partir do foco nas pessoas que os projetos podem se desenvolver aplicando soluções tecnológicas simples e práticas, seja nas smart cities ou nas comunidades planejadas. O desafio é se ater a mecanismos que facilitem o dia a dia de cada morador.
Um dos projetos de grande destaque no cenário atual é a Cidade de Masdar, no leste de Abu Dhabi, que utiliza avanços tecnológicos disponíveis em todo mundo para um progresso de sucesso em sua construção. Bons exemplos são revestimentos nas edificações como solução sobre o clima local e uso de instalações solares para a produção de energia limpa.
Riscos de segregação
Ainda nos desafios enfrentados pelos desenvolvedores, entusiastas das smart cities apontam o risco de uma segregação espacial que implica numa fragmentação demográfica. Tendo em vista que a segurança é um dos fatores essenciais na narrativa urbana, é essencial que os projetos levem em considerações os arredores.
É necessário entender esses novos espaços como um ambiente fluido, diferenciado dos condomínios fechados. Fluidez que também deve ser notada na flexibilidade do projeto com a tipologia da área.
Destacada tanto por entusiastas quanto por críticos das smart cities, está a cidade Songdo, na Coreia do Sul. Se por um lado Songdo é elogiada pelo bom uso de inovações tecnológicas, como serviço público digitalizado e pisos de apartamentos que respondem ao peso dos moradores, identificando eventuais quedas drásticas, por outro lado é rigidamente criticada pela sua estrutura genérica. Sociólogos e historiadores ainda apontam que esse modelo acaba gerando exclusão social, aumentando consequentemente as taxas de criminalidade, além de serem inflexíveis quanto a mudanças circunstanciais.
A projeção básica que muitos críticos apontam é de que, se o ambiente está sendo criado para o futuro, deve ser considerado um espaço para espontaneidade e transformações.
Debater tendências de mercado
Em razão da necessidade deste debate sobre organização, estruturação e soluções urbanistas, a Associação para o Desenvolvimento Imobiliário e Turístico do Brasil (ADIT Brasil) leva para a capital cearense a 8ª edição do Complan – Seminário sobre Comunidades Planejadas, Loteamentos e Desenvolvimento Urbano.
Reunindo os principais players do mercado, o evento apontará as principais tendências do mercado e problemas enfrentados pelo Brasil em suas diferentes regiões. Os participantes realizarão, ainda, visitas técnicas nos empreendimentos: Cidade Alpha; Azur Condomínio Lago; Reserva Terra Brasilis; Portal do Eusébio; Quinta dos Lagos; Vilas do Lago; Alphaville; Golf Ville; Mandara Kauai; Mandara Lanai; Aquiraz Riviera; Cidade Cauype; e Smart City Laguna.
O Complan acontece nos dias 22 e 23 de outubro em Fortaleza. As inscrições já estão abertas e podem ser realizadas AQUI.
Por: Klaus Roger – Conteúdo ADIT Brasil
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