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Como a liberdade no planejamento urbano pode criar cidades melhores para as pessoas
POR ADIT BRASIL
Inclusiva, segura e sustentável. É até fácil imaginar uma cidade perfeita, mas alcançar tal objetivo pode ser uma utopia. Barcelona, Tokyo e Chicago figuram em rankings famosos como o da revista Time Out (que leva em consideração aspectos como mobilidade urbana, moradia e acesso à cultura para a classificação), mas possuem perfis diferentes entre si. Segundo o economista e pesquisador Matheus Hector, esse desejo pela perfeição tem reduzido a liberdade e o desenvolvimento urbano como um todo. “Todas as tentativas de fazê-la por aqui falharam, basta ver Brasília e todo espólio modernista. A beleza está na diferença. O que precisa estar na nossa cabeça é que quem constrói as cidades são as pessoas, não o governo”, diz.
Ele defende que o setor público precisa promover condições básicas para permitir que as cidades cresçam. “Porém, no Brasil é o oposto, não ofertamos o básico e não permitimos que as cidades se desenvolvam sozinhas”.
“O setor privado precisa desenvolver uma agenda colocando a cidade em primeiro lugar, afinal as mesmas regras que impedem cidades mais compactas e agradáveis, são as mesmas que impedem o desenvolvimento do setor”, afirma o fundador do Consilium, entidade de debate de políticas públicas e formação de jovens lideranças.
Fachada ativa, uso misto de regiões, boas calçadas, iluminação e zeladoria são medidas de impacto que tornam o entorno mais seguro e interessante. Um bom planejamento urbano contempla tudo isso. Hector também destaca o fator densidade urbana como fundamental.
A densidade urbana corresponde ao número de habitantes que ocupam determinada área urbana, ou uma parcela dessa área, como um quarteirão, um bairro, um país. Refere-se ao número de pessoas pela unidade de superfície.
“É impossível imaginar que uma cidade em que se demora mais de duas horas para chegar ao trabalho seja agradável para as pessoas”, afirma. “Se o Centro Expandido de São Paulo tivesse a mesma densidade que Manhattan, 2.000.000 de pessoas poderiam morar muito mais próximas ao trabalho e serem menos refém dos carros.” No fim das contas, o ambiente urbano ficaria mais sustentável e agradável.
Com a crise do COVID-19 ainda em curso em âmbito global, a vida urbana foi alterada de forma significativa – e deve ter impacto profundo na estrutura social das cidades pelas próximas gerações. “Um a cada cinco paulistanos mora irregularmente ou está em situação de vulnerabilidade. A pandemia deixou claro que a política habitacional no Brasil é um desastre. O que me entristece é que precisamos de uma pandemia para enxergar isso, afinal muitos não conseguiram fazer isolamento social”, explica o estudioso. Apesar de tudo, ele não concorda com a afirmação de que as cidades estão “morrendo”.
“É pura bobagem. De um lado precisamos de um choque de capitalismo, dando mais liberdade para se construir, e de outro, um choque de solidariedade com maiores incentivos e crédito para habitação social. Espero que esse último seja o discurso vencedor.”
LEGISLAÇÃO E ERROS ANTIGOS
O que tem impedido o setor privado de construir moradias baratas em grandes quantidades é a legislação vigente. Restrições como coeficiente de aproveitamento, zoneamento e parcelamento do solo acabam sendo os principais entraves. Hector aponta o recente estudo do Economista Ciro Biderman para consulta. “O texto mostra que só essas duas últimas restrições [citadas anteriormente] podem aumentar em 50% a informalidade de uma cidade.”
Entre os exemplos positivos no Brasil ele cita Goiânia (GO). “Por lá, se resolveu adotar um modelo menos restritivo, o que justifica uma das menores taxas de favelização do país. Basta olhar os dados para ver que as cidades brasileiras estão muito fora do padrão mundial. Enquanto um imóvel equivale a 13 anos de trabalho de um paulistano, em Chicago e Tokyo este número não chega a 5.”
Na recente eleição, Matheus Hector foi candidato a Vereador pelo partido Novo. Com pautas voltadas para o urbanismo, ele fez uma campanha polêmica, sugerindo, por exemplo, acabar com o Jardim Europa e com o Minhocão, em São Paulo, bem como ceder os viadutos para a iniciativa privada. “Apanhei muito. De um lado, a esquerda falando que eu queria privatizar a cidade e entregar para o setor imobiliário. De outro, moradores das regiões mais ricas boicotando minha campanha e impedindo meu acesso a qualquer possível doador de campanha”, conta. “Mas me orgulho muito, pois colocamos assuntos difíceis no debate público e muitas pessoas se engajaram, começaram a entender o tema e amar mais a própria cidade.”
Segundo ele, os principais problemas de São Paulo habitam nesse segmento. As cidades brasileiras seguem insistindo nos mesmos erros há décadas. “As excessivas regras para se construir impediram o setor privado de ofertar novas moradias, o preço da habitação subiu e as cidades foram se espraiando. As pessoas estão morando cada vez mais longe e em habitações irregulares.” Aumento do trânsito, encarecimento do transporte público, aumento do custo de infraestrutura e destruição do Meio Ambiente e regiões de mananciais são algumas das consequências.
“E ainda soma-se a isso tudo, o carro como principal ferramenta de transporte. Temos uma bomba relógio.”
Mudar a lógica do planejamento urbano é o caminho que ele defende. “Não tenho dúvida que este é o nosso principal problema, pois nos permite resolver vários outros dentro da mesma esfera.”
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