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Além da Curva com Cristiane Portella | Um bate-papo sobre financiamento imobiliário, Lei da Alienação Fiduciária e apetite dos bancos
Seja por instabilidade das regras do jogo ou por questões de funding, o financiamento imobiliário no Brasil ainda tem muito o que evoluir. O crescimento extremamente inesperado do último ano, mesmo diante a pandemia do COVID-19, é um forte indício do potencial a ser alcançado. “A previsão inicial para o ano de 2020 estava na ordem de 32%. Um número que já era bastante positivo, até pela retomada do mercado. Nos surpreendemos ao fechar o ano com um crescimento de 52%. Ao todo foram financiados R$ 124 bilhões com recurso de poupança. É um recorde, também, em valor absoluto”, explica Cristiane Portella, Presidente da Abecip, a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança.
Durante sua participação no podcast Além da Curva, com Felipe Cavalcante, ela fez um panorama atualizado sobre financiamento imobiliário no país, comentou o apetite dos bancos na recente crise, o que esperar da taxa de juros daqui para frente e a atuação da ABECIP na modernização do setor.
Com uma sólida carreira na área financeira com passagem pelas áreas comercial, produtos e marketing, Cristiane foi Diretora de crédito imobiliário e consórcio do Itaú Unibanco por 15 anos. Para ela, o apetite dos bancos despertou, também, por causa da Lei de Alienação Fiduciária.
“Quando não tínhamos essa lei, e eventualmente se precisava retomar imóvel por causa de pagamento, era um processo que se arrastava e era inconcluso. Testar a lei e vê-la funcionando de forma positiva foi muito importante”, diz.
A alienação fiduciária é uma forma de garantia de pagamento de uma dívida. Na lei 9514, o devedor transfere a propriedade de determinado bem ao credor. Dentro desse prazo do pagamento, o bem é juridicamente pertencente ao credor. Ao ser quitada a dívida, o bem volta a ser do ex-devedor. “Vale ressaltar que, quando um banco empresta, o objetivo nunca é retomar o imóvel. O foco é sempre fazer um financiamento palatável para que, no futuro, essa pessoa troque por um financiamento ainda maior.”
Ainda sobre esse movimento de valorização do financiamento com garantia imobiliária, ela destaca o esforço de nacionalizar o título de Home Equity – que é a modalidade que permite empréstimos com juros mais baixos que outras modalidades. “Estamos tentando alterar esse termo para Crédito com Garantia de Imóvel mesmo. Para que as pessoas comecem a avaliar essa possibilidade e conseguir mais liquidez.”
Por representar menos riscos para os bancos e estabelecer uma relação de longo prazo entre instituição financeira e consumidor final, o financiamento imobiliário nesse formato significa uma relação pré-estabelecida de até 35 anos. “Os contratos são originados assim, mas a média de duration hoje está na média dos 12, 13 anos”, diz.
O duration é uma forma de cálculo do prazo médio de um fluxo de caixa que procura levar em conta o valor do dinheiro no tempo. Trata-se de um número muito relevante para as instituições.
“Quando as pessoas começam a ganhar mais, passam a amortizar essa dívida, usando, por exemplo, algum recurso poupado. No financiamento imobiliário você não tem juros embutidos nas prestações futuras. Por ser um sistema de amortização constante, ninguém é penalizado se pegar um financiamento de 30 anos e quitá-lo em 15”, explica.
Adquirir a casa própria ainda é um projeto de vida da maioria das pessoas. A manutenção dessa relação ao longo de décadas faz com que, em um momento de escolha do financiamento, o cliente acabe priorizando aquele banco que te estendeu a mão no passado. “Hoje vemos as instituições se esforçando de forma mais ativa, indo atrás dos clientes e fazendo convênio com imobiliárias, por exemplo. Há uma briga positiva para o consumidor”, explica Cristiane.
Apesar dessa maior movimentação, a abordagem com o cliente tem sido feita de forma equilibrada e coesa, seguindo, inclusive, os atuais parâmetros da Lei Geral de Proteção de Dados, a LGPD.
“A época de fazer contato sem uma contextualização ficou para trás. É abominável. Ninguém quer ser incomodado com telemarketing, banner ou pop up sem que aquilo seja pertinente”, conta. “Tem que fazer sentido para o usuário. Esse é o segredo”, afirma.
Segundo ela, o mercado financeiro como um todo se movimenta para prever necessidades e entender o que faz sentido ou não. “Se fala muito em fintech, bigtechs e bancos não convencionais, mas os bancos não são mais convencionais há muito tempo. Já existem áreas dentro dessas instituições que desafiam, internamente, os próprios processos. Nada está parado.” Para fazer diferente é preciso desconstruir a forma como se fazia anteriormente. “E é justamente esse movimento que eu enxergo vindo dos players de um jeito muito forte e presente.
O MELHOR MOMENTO PARA COMPRAR UM IMÓVEL É AGORA
Ao considerar dados externos, Cristiane Portella acredita em um reajuste com previsão de Selic a 5%. “O natural é que haja um crescimento. Em função da pandemia, os ajustes fiscais e tributários têm oscilado muito.” Também levando em conta o patamar de juros que chegamos e a velocidade com que caiu, existe uma especulação futura de juros entre 6 e 8,5% – com uma população que ainda vai continuar comprando. É o que ela aponta. “O melhor momento para comprar um imóvel é agora. Olhando para o futuro, a taxa, numa melhor estimativa, deve estar em 8.3% em 5 anos e 9.1% em 10 anos.”
Uma especificidade única do brasileiro é a origem dos seus recursos. Do funding. “Em nenhum país do mundo você encontra um funding que é aprovado em 30 dias e te é emprestado por 30 anos. É peculiar do brasileiro trabalhar dessa forma. Quando que, no passado, uma pessoa sem conta corrente no banco já começa esse relacionamento com um financiamento imobiliário?”.
E por qual razão o mercado está crescendo? “As instituições e as pessoas querem fazer isso acontecer. A taxa cabe no bolso e o momento é de condições jurídicas e legislativas favoráveis”, conclui.
Ainda no bate-papo, cartórios, portabilidade, loteamentos e relacionamento com as incorporadoras.
Para ouvir e acompanhar todas as entrevistas, basta acessar o site da ADIT BRASIL em http://adit.com.br/podcasts/
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