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Artigo – Hotéis e empreendimentos imobiliários ancorados em Vinícolas: o Vinho como estratégia de destino e valor territorial
Por Fernando Anderle – Diretor da Vinícola Thera
Para que existisse vida na Terra, foi necessária uma combinação tão precisa de fatores que, mesmo num universo com sextilhões de planetas, a chance de encontrar vida em outros lugares é mínima. De certa forma, o mesmo raciocínio se aplica ao universo do vinho – e também aos projetos que o envolvem. Como disse Philippine de Rothschild: “Fazer vinho é relativamente simples, só os primeiros 200 anos são difíceis”.
Essas duas ideias sintetizam a essência desse negócio: tempo, paciência e uma rara combinação de elementos. Quando falamos de empreendimentos que unem vinícolas, hospitalidade e projetos imobiliários, essa equação se torna ainda mais complexa. Surge então, um dilema fundamental: qual o negócio que realmente se pretende? Ser uma vinícola reconhecida? Um hotel? Um projeto de real estate?
As três vertentes se entrelaçam, mas exigem competências e estratégias distintas. Quem faz um bom vinho não é necessariamente um bom hoteleiro – e vice-versa. Da mesma forma, um terroir ideal para um vinho de excelência pode não ser, obrigatoriamente, o melhor local para um empreendimento imobiliário.
No mundo do vinho, o mantra “localização, localização e localização” ganha uma nova dimensão. Enquanto para o sucesso de um projeto imobiliário ou hoteleiro o entorno, o clima, a paisagem, o deslocamento e a distância dos grandes centros são fundamentais, para o vinho, o terroir é imprescindível. É a combinação exata desses fatores que define a qualidade da vinícola, e, por extensão, o sucesso de qualquer empreendimento que dele se inspire.
Modelos de estrutura e estratégias de integração
Ao estruturar um projeto de hospitalidade e lazer ancorado em vinícolas, surge outra questão: o modelo será vertical, com a vinícola integrada a todo o ecossistema de negócios do mesmo grupo econômico, ou horizontal, com negócios independentes que se complementam?
Há caminhos distintos. Grandes redes podem escolher vinícolas de excelência e criar uma “Wine Edition”, com experiências integradas e consistentes de alto padrão. Por outro lado, muitas vinícolas, impulsionadas pelo sucesso de sua gastronomia e do enoturismo, acabam criando suas próprias pousadas, em que o hotel nasce naturalmente do vinho. Depois, quem sabe, um empreendimento imobiliário.
Mas é preciso clareza: a vinícola será apenas parte do landscape ou um negócio em si? Essa definição é determinante para o modelo operacional, o retorno sobre o investimento e a viabilidade de longo prazo. Afinal, a viticultura é um negócio agrícola, industrial e comercial, sujeito às intempéries, à técnica e à capacidade de posicionar o produto no mercado. Já a hospitalidade é feita de serviço, atendimento, experiência e encantamento.
Enquanto uma depende de terroir e safra, a outra depende de pessoas e gestão. E, mesmo quando coexistem, precisam funcionar de forma complementar e sustentável.
Enoturismo, Ecoturismo e a Força do Placemaking
Surge o conceito de enoecoturismogastronômico. Mais do que visitar uma vinícola, trata-se de viver um ecossistema completo, no qual o vinho é o fio condutor de uma jornada sensorial e emocional.
Nesse ambiente, tudo se conecta: o hóspede que prolonga a estadia, o aumento da diária média, a venda direta de vinhos, o consumo nos restaurantes e até a valorização do real estate num projeto de condomínio de casas ou lotes. O vinho deixa de ser apenas produto e se torna ferramenta de placemaking, um elemento capaz de dar identidade e alma a um destino.
Quando bem estruturado, o resultado é natural: aumento da permanência média, vendas internas mais fortes, maior atratividade imobiliária e fidelização do público. O visitante se torna cliente, e o cliente, embaixador da marca.
A arte da combinação
O desafio está em fazer com que todas essas operações — vinícola, hotel, gastronomia, experiências — sejam rentáveis e coerentes com o propósito. Quando isso acontece, o empreendimento se transforma em algo maior do que um negócio: se torna uma experiência integrada, em que o terroir se traduz em hospitalidade, o vinho em cultura e o visitante em parte dessa história.
Pousadas, restaurantes, wine bars, empórios e delicatessens, centros de eventos, trilhas, cavalgadas, piqueniques, espaços de wellness e até mesmo museus – tudo pode compor esse universo. Mas, como no vinho, o segredo está na harmonia entre os elementos.
Porque, no fim das contas, o segredo de um bom empreendimento, assim como o de um bom vinho, está na combinação perfeita de fatores. E essa, como sabemos, é uma arte rara.

Fernando Anderle é engenheiro Civil e administrador, mestre em Administração, Especialista em Gestão de Negócios Imobiliários, Marketing e Varejo e em Gestão e Governança Corporativa. Anderle também é diretor de Negócios e Desenvolvimento Imobiliário na HZ Participações, Grupo Fazenda Bom Retiro e Vinícola Thera.

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